Por Gil DePaula
Sim! É verdade. Virgulino Ferreira, dezenas de vezes antes de matar, realizava cantorias entoadas por eles e seus bandoleiros, bem como arrasta-pés, onde estivessem. Além das mortes, muitos tinham partes do corpo trucidadas, tais quais; orelhas, dedos e línguas. Outras vezes, homens e mulheres eram obrigados a dançarem nus.
Apesar de ter sua figura romantizada, Lampião não passava de um bandido covarde e sanguinário, capaz das maiores torpezas, como os estupros às mulheres
Perfil
Perfil
Virgulino Ferreira da Silva; o Lampião ou o Rei do Cangaço, nasceu em Serra Talhada em 4 de junho de 1898 e foi morto em Poço Redondo em 28 de julho de 1938. Foi um cangaceiro brasileiro que atuou na região do sertão nordestino do Brasil. Lampião foi provavelmente o bandido mais conhecido do século XX.
Nascido na cidade de Vila Bela, atual Serra Talhada, no semiárido do estado de Pernambuco, foi o terceiro filho de José Ferreira dos Santos e Maria Sucena da Purificação.
Até os 21 anos de idade trabalhou como artesão. Era alfabetizado e usava óculos para leitura, características bastante incomuns para a região sertaneja e pobre onde ele morava. Uma das versões a respeito de seu apelido é que sua capacidade de atirar seguidamente, iluminando a noite com seus tiros, fez com que recebesse o apelido de lampião.
Sua família travava uma disputa com outras famílias locais, geralmente por limites de terras, até que seu pai foi morto em confronto com a polícia em 1919. Virgulino jurou vingança, e junto de mais dois irmãos, passou a integrar o grupo do cangaceiro Sinhô Pereira.
Em 1922, tornou-se líder do bando até então comandado por Sinhô Pereira em Pernambuco. No mesmo ano, matou o informante que entregou seu pai à polícia, e realizou o maior assalto da história do cangaço, contra a Baronesa de Água Branca em Alagoas.
Além do grupo principal, Lampião tinha o comando de diversos subgrupos paralelos, designando outros cangaceiros para comandá-los, a exemplo de Corisco e Antonio de Engracia.
Durante quase 20 anos, Lampião viajou com seu bando de cangaceiros. Andavam à cavalo e em trajes de couro (chapéus, sandálias, casacos, cintos de munição e calças) para protegê-los dos arbustos com espinhos típicos da vegetação da caatinga.
Para proteger o “capitão” (como Lampião era chamado) e realizar ataques a fazendas e municípios, faziam uso de um potente poder bélico. Como não existiam contrabandos de armas, as mesmas eram – em sua maioria – roubadas da polícia e de unidades paramilitares.
A arma mais utilizada era o rifle Winchester. O bando chamava os integrantes das volantes (policiais) de “macacos” – uma alusão ao modo como os soldados fugiam quando avistavam o grupo de Lampião: “pulando”.
Lampião e seu bando atacaram fazendas e cidades em sete estados. Roubavam gado, realizavam saques, sequestros, assassinatos, torturas, mutilações e estupros. Sua passagem causava terror e indignação nos moradores, fato citado amplamente na época.
Apesar disso, Lampião e seu bando eram frequentemente protegidos por coiteiros, conhecidos como fazendeiros, pequenos sitiantes ou mesmo autoridades locais que ofereciam abrigo e alimentos aos bandos por um curto espaço de tempo nos limites de suas terras, facilitando o deslocamento dos cangaceiros pelo Nordeste e sua fuga das forças policiais do Estado.
Vida pessoal
Vida pessoal
Sua companheira, Maria Gomes de Oliveira, conhecida como Maria Déa ou como Maria Bonita, juntou-se ao bando em 1930, sendo a primeira das mulheres a integrá-lo.
Virgulino e Maria Bonita tiveram uma filha, Expedita Ferreira Nunes, nascida em 13 de setembro de 1932. O casal teria tido ainda dois natimortos.
Virgulino era devoto de Padre Cícero e respeitava as suas crenças e conselhos. Os dois se encontraram uma única vez, no ano de 1926, em Juazeiro do Norte.
Morte
Morte
No dia 27 de julho de 1938, o bando acampou na fazenda Angicos, situada no sertão de Sergipe, esconderijo tido por Lampião como o de maior segurança. Era noite, chovia muito e todos dormiam em suas barracas. A volante chegou tão silenciosamente que nem os cães perceberam. Por volta das 5:00h do dia 28, os cangaceiros levantaram para rezar o ofício e se preparavam para tomar café; quando um cangaceiro deu o alarme, já era tarde demais.
Não se sabe ao certo quem os traiu. Entretanto, naquele lugar mais seguro, o bando foi pego totalmente desprevenido. Quando os policiais do Tenente João Bezerra e do Sargento Aniceto Rodrigues da Silva abriram fogo com metralhadoras portáteis, os cangaceiros não conseguiram realizar qualquer tentativa de defesa.
O ataque durou cerca de vinte minutos e poucos conseguiram escapar ao cerco e à morte. Dos trinta e quatro cangaceiros presentes, onze morreram ali mesmo. Lampião foi um dos primeiros a morrer. Logo em seguida, Maria Bonita foi gravemente ferida. Alguns cangaceiros, transtornados pela morte inesperada do seu líder, conseguiram escapar. Bastante eufóricos com a vitória, os policiais apreenderam os bens e mutilaram os mortos. Apreenderam todo o dinheiro, o ouro e as joias.
A força volante, seguindo o costume da época, decepou a cabeça de Lampião. Maria Bonita ainda estava viva, apesar de bastante ferida, quando foi degolada. O mesmo ocorreu com Quinta-Feira, Mergulhão (os dois também tiveram suas cabeças arrancadas em vida), Luís Pedro, Elétrico, Enedina, Moeda, Alecrim, Colchete e Macela.
Um dos policiais desferiu um golpe de coronha de fuzil na cabeça de Virgulino, deformando-a. Este detalhe contribuiu para difundir a lenda de que Lampião não havia sido morto e escapara da emboscada, tal foi a modificação causada na fisionomia do cangaceiro. Feito isso, salgaram os seus troféus de vitória e colocaram em latas de querosene, contendo aguardente e cal.
Os corpos mutilados e ensanguentados foram deixados a céu aberto, atraindo urubus. Para evitar a disseminação de doenças, dias depois foi colocada creolina sobre os corpos.
Percorrendo os estados nordestinos, o coronel João Bezerra exibia as cabeças (já em adiantado estado de decomposição) por onde passava, atraindo uma multidão de pessoas.
Primeiro, estiveram em Piranhas, onde os restos mortais foram arrumados cuidadosamente na escadaria da Prefeitura, junto com armas e apetrechos dos cangaceiros e fotografados. Depois, foram levados a Maceió e ao sudeste do Brasil.
No IML de Aracaju, as cabeças foram examinadas pelo Dr. Carlos Menezes. Depois de medidas e pesadas, os criminalistas mudaram a teoria de que um homem bom não viraria um cangaceiro, e que este deveria ter características sui generis. Ao contrário do que pensavam, as cabeças não apresentaram qualquer sinal de degenerescência física, anomalias ou displasias, tendo sido classificadas, pura e simplesmente, como normais.
Do sudeste do País, apesar do péssimo estado de conservação, as cabeças seguiram para Salvador, onde permaneceram por seis anos na Faculdade de Odontologia da UFBA. Lá, tornaram a ser medidas, pesadas e estudadas, na tentativa de se descobrir alguma patologia.
Posteriormente, os restos mortais ficaram expostos no Museu Antropológico Estácio de Lima localizado no prédio do Instituto Médico Legal Nina Rodrigues, em Salvador, por mais de três décadas.
Durante muito tempo, as famílias de Lampião, Corisco e Maria Bonita lutaram para dar um enterro digno a seus parentes. O economista Sílvio Bulhões, filho de Corisco e Dadá, em especial, empreendeu muitos esforços para dar um sepultamento aos restos mortais dos cangaceiros e parar, de uma vez por todas, a macabra exibição pública.
Segundo o depoimento do economista, dez dias após o enterro de seu pai, a sepultura foi violada, o corpo foi exumado, e sua cabeça e braço esquerdo foram cortados e colocados em exposição no Museu Nina Rodrigues.
O enterro dos restos mortais dos cangaceiros só ocorreu depois do Projeto de Lei nº 2.867, de 24 de maio de 1965. Tal projeto teve origem nos meios universitários de Brasília (em particular, nas conferências do poeta Euclides Formiga), e as pressões do povo brasileiro e do Clero o reforçaram.
As cabeças de Lampião e Maria Bonita foram sepultadas no dia 6 de fevereiro de 1969. Os demais integrantes do bando tiveram seu enterro uma semana depois.
Mulher Rendeira
Mulher Rendeira
“Mulher Rendeira” é um antigo tema popular, muito cantado nos sertões nordestinos ao tempo de Lampião, e cuja origem é controversa. Segundo a versão mais conhecida do padre Frederico Bezerra Maciel, regionalista pernambucano e biógrafo de Lampião, o mesmo teria escrito os versos da versão original da música.
A ele se acrescenta Câmara Cascudo, segundo o qual Lampião teria feito escrito a letra em homenagem ao aniversário de sua avó d. Maria Jocosa Vieira Lopes (“Tia Jacosa”) em 15 de setembro, que era uma rendeira. Compôs a música entre setembro de 1921 e fevereiro de 1922, quando apresentou a música em Floresta (Pernambuco).
A música tornou-se praticamente um hino de guerra dos cangaceiros do bando de Lampião, tendo inclusive relatos de que o seu ataque a Mossoró em 1927 teria sido feito com mais de 50 cangaceiros cantando “Mulher Rendeira”.
Por isso foi incluído no premiado filme “O Cangaceiro”, de Lima Barreto, que o celebrizou no país e no exterior. Na ocasião, sofreu uma adaptação do compositor Zé do Norte (Alfredo Ricardo do Nascimento), autor de outras músicas do filme, que manteve a sua estrutura original. Há também uma gravação de um antigo cabra do bando de Lampião, o cangaceiro Volta Seca.
Livros de Gil DePaula
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