Maria, a Mãe Santíssima

maria-1024x683 <strong>Maria, a Mãe Santíssima</strong>

Junto da cruz, o vulto agoniado de Maria produzia dolorosa e indelével impressão. Com o pensamento ansioso e torturado, olhos fixos ao madeiro das perfídias humanas, a ternura materna regredia ao passado em amarguradas recordações. Ali estava o filho bem-amado, na hora extrema.

Recordações da Mãe

Maria deixava-se ir na corrente infinda das lembranças. Eram as circunstâncias maravilhosas em que o nascimento de Jesus lhe fora anunciado, a amizade de Isabel, as profecias do velho Simeão, reconhecendo que a assistência de Deus se tornara incontestável nos menores detalhes de sua vida.

Naquele instante supremo, revia a manjedoura, na sua beleza agreste, sentindo que a Natureza parecia desejar redizer aos seus ouvidos o cântico de glória daquela noite inolvidável. Através do véu espesso das lágrimas, repassou, uma por uma, as cenas da infância do filho estremecido, observando o alarma interior das mais doces reminiscências.

A Dor de Ver Sofrer o Inocente

Em cada detalhe, reconhecia a intervenção da Providência; mas agora, seu pensamento vagava pelo mar das aflitivas interrogações:
Que fizera Jesus por merecer tão amargas penas?

Ela o vira crescer sob a luz da pureza, guiado por sentimentos imaculados. Desde cedo, encantava com seu carinho fraterno, sua compaixão pelas criaturas. Lembrava-se com ternura do dia em que ele levou à sua casa dois ladrões do vale de Mizhep, tratando-os com amor como se fossem irmãos.

Depois da paisagem doméstica, veio a missão divina: paralíticos que andavam, cegos que enxergavam, almas famintas de luz que se saciavam em sua infinita bondade.

O Clímax do Sacrifício

Que profundos desígnios haviam conduzido seu filho à cruz do suplício?

Uma voz interior lhe dizia das determinações justas de Deus. E, mesmo entre lágrimas, repetia sua humildade:
“Faça-se na escrava a vontade do Senhor!”

Jesus atingia o limite dos padecimentos inenarráveis. A turba o açoitava, zombava, enquanto Maria suportava, com alma dilacerada. Então, percebeu João aproximar-se. O discípulo amado, vencendo a pusilanimidade dos outros, oferecia-lhe o ombro e o amparo. Ambos buscaram ansiosamente a luz dos olhos do Crucificado.

A Última Lição de Amor

Jesus, em seu olhar de dor e ternura, murmurou:
— Mãe, eis aí teu filho.
— Filho, eis aí tua mãe.

Maria envolveu-se no véu de seu pranto. João, o evangelista, entendeu que ali estava a lição definitiva: o amor universal como coroa suprema da obra do Cristo.

Os Dias em Batanéia

Após a crucificação, Maria retirou-se para Batanéia, entre parentes que a acolheram com carinho. Os anos passaram tristes, e ela viu as lembranças do filho tornarem-se objeto de disputas entre seus seguidores.

Na Galileia, os antigos lares de fé estavam desertos. O vinho de Caná dera lugar ao vinagre do martírio. Mas sua alma permanecia fiel à esperança celeste.

O Refúgio em Éfeso

João, lembrando das palavras de Jesus, foi ao seu encontro. Instalara-se em Éfeso, onde a doutrina ganhava espaço. Convidou Maria a viver com ele, e ela aceitou com alegria.

Na casa humilde ao sul da cidade, distante três léguas, construíram um lar de amor e acolhimento. Ali, a “Casa da Santíssima” virou santuário para os necessitados. Doentes, aflitos e desamparados acorriam em busca da ternura materna daquela que fora a mãe do Salvador.

Mãe dos Necessitados

Maria atendia a todos com bondade. A tradição do nome “Santíssima” surgiu quando um leproso curado beijou-lhe as mãos e murmurou:
— Senhora, sois a mãe de nosso Mestre… e nossa Mãe Santíssima.

A cada dia, os desamparados se reuniam. Enquanto João pregava na cidade, Maria confortava as almas feridas. Mães, enfermos, aflitos vinham buscar sua palavra. Ela dizia:
— Isso também passa. Só o Reino de Deus é eterno em nossas almas.

As Últimas Meditações

Com o tempo, João era cada vez mais requisitado em Éfeso. Maria permanecia só na colina, mas nunca se sentia abandonada. As ondas do mar lhe traziam lembranças do Tiberíades, os aromas da noite pareciam ecoar os tempos em que Jesus ensinava ao povo.

A velhice não lhe trouxe amargura. Sua fé era seu consolo. Vivendo de saudades, ela era iluminada pela esperança.

O Peregrino da Noite Estrelada

Certa noite, soube das perseguições que assolavam os cristãos em Roma. Preocupada, entregou-se às preces por todos os que sofriam por amor ao seu filho.

Então, no silêncio estrelado, um peregrino bateu à sua porta. Disse:
— Minha mãe, venho fazer-te companhia e receber tua bênção.

Maria, emocionada, o acolheu. A voz do estranho lhe tocava a alma como há muito não sentia. Era uma voz conhecida, cheia de doçura. Nenhum pedinte até então viera dar algo — mas aquele viandante lhe trazia consolo.

A Revelação

Maria chorava de ventura, sem entender por quê. Até que o peregrino lhe estendeu as mãos e disse, com amor profundo:

— Minha mãe, vem aos meus braços!…

Nesse instante, fitou as mãos nobres que se lhe ofereciam, num gesto da mais bela ternura. Tomada de comoção profunda, viu nelas duas chagas, como as que seu filho revelava na cruz e, instintivamente, dirigindo o olhar ansioso para os pés do peregrino amigo, divisou também aí as vísceras causadas pelos cravos do suplício.

Não pôde mais. Compreendendo a visita amorosa que Deus lhe enviava ao coração, bradou com infinita alegria:

— “Meu filho! Meu filho! As úlceras que te fizeram!…”

O Encontro Sublime

E, precipitando-se para ele, como mãe carinhosa e desvelada, quis certificar-se, tocando a ferida que lhe fora produzida pelo último lançaço, perto do coração. Suas mãos ternas e solícitas o abraçaram na sombra visitada pelo luar, procurando sofregamente a úlcera que tantas lágrimas lhe provocara ao carinho maternal. A chaga lateral também lá estava, sob a carícia de suas mãos.

Não conseguiu dominar o seu intenso júbilo. Num ímpeto de amor, fez um movimento para se ajoelhar. Queria abraçar-se aos pés do seu Jesus e osculá-los com ternura. Ele, porém, levantando-se, cercado de um halo de luz celestial, se lhe ajoelhou aos pés e, beijando-lhe as mãos, disse em carinhoso transporte:

— “Sim, minha mãe, sou eu!… Venho buscar-te, pois meu Pai quer que sejas no meu Reino a Rainha dos Anjos!…”

O Êxtase Final

Maria cambaleou, tomada de inexprimível ventura. Queria dizer da sua felicidade, manifestar seu agradecimento a Deus; mas o corpo como que se lhe paralisara, enquanto aos seus ouvidos chegavam os ecos suaves da saudação do Anjo, qual se a entoassem mil vozes cariciosas, por entre as harmonias do céu.

Ao outro dia, dois portadores humildes desciam a Éfeso, de onde regressaram com João, para assistir aos últimos instantes daquela que lhes era a devotada Mãe Santíssima.

A Partida da Alma Eleita

Maria já não falava. Numa inolvidável expressão de serenidade, por longas horas ainda esperou a ruptura dos derradeiros laços que a prendiam à vida material.

A alvorada desdobrava o seu formoso leque de luz quando aquela alma eleita se elevou da Terra, onde tantas vezes chorara de júbilo, de saudade e de esperança. Não mais via seu filho bem-amado, que certamente a esperaria com as boas-vindas no seu Reino de Amor; mas extensas multidões de entidades angélicas a cercavam, cantando hinos de glorificação.

A Visita à Galileia

Experimentando a sensação de se estar afastando do mundo, desejou rever a Galileia com os seus sítios prediletos. Bastou a manifestação de sua vontade para que a conduzissem à região do lago de Genesaré, de maravilhosa beleza. Reviu todos os quadros do apostolado de seu filho e, só agora, observando do alto a paisagem, notava que o Tiberíades, em seus contornos suaves, apresentava a forma quase perfeita de um alaúde.

Lembrou-se, então, de que naquele instrumento da Natureza Jesus cantara o mais belo poema de vida e amor, em homenagem a Deus e à humanidade. Aquelas águas mansas, filhas do Jordão marulhoso e calmo, haviam sido as cordas sonoras do cântico evangélico.

O Amor pelos Discípulos Sofredores

Dulcíssimas alegrias lhe invadiam o coração e já a caravana espiritual se dispunha a partir, quando Maria se lembrou dos discípulos perseguidos pela crueldade do mundo e desejou abraçar os que ficariam no vale das sombras, à espera das claridades definitivas do Reino de Deus.

Emitindo esse pensamento, imprimiu novo impulso às multidões espirituais que a seguiam de perto. Em poucos instantes, seu olhar divisava uma cidade soberba e maravilhosa, espalhada sobre colinas enfeitadas de carros e monumentos que lhe provocavam assombro. Os mármores mais ricos esplendiam nas magnificentes vias públicas, onde as liteiras patrícias passavam sem cessar, exibindo pedrarias e peles, sustentadas por misérrimos escravos.

A Descida aos Cárceres

Mais alguns momentos e seu olhar descobria outra multidão guardada a ferros em escuros calabouços. Penetrou os sombrios cárceres do Esquilino, onde centenas de rostos amargurados retratavam padecimentos atrozes. Os condenados experimentaram no coração um consolo desconhecido.

Maria se aproximou de um a um, participou de suas angústias e orou com as suas preces, cheias de sofrimento e confiança. Sentiu-se mãe daquela assembleia de torturados pela injustiça do mundo. Espalhou a caridade misericordiosa de seu espírito entre aquelas fisionomias pálidas e tristes. Eram anciães que confiavam no Cristo, mulheres que por ele haviam desprezado o conforto do lar, jovens que depunham no Evangelho do Reino toda a sua esperança.

O Presente da Alegria

Maria aliviou-lhes o coração e, antes de partir, sinceramente desejou deixar-lhes nos espíritos abatidos uma lembrança perene. Que possuía para lhes dar? Deveria suplicar a Deus para eles a liberdade? Mas Jesus ensinara que com Ele todo jugo é suave e todo fardo seria leve, parecendo-lhe melhor a escravidão com Deus do que a falsa liberdade nos desvãos do mundo.

Recordou que seu filho deixara a força da oração como um poder incontrastável entre os discípulos amados. Então, rogou ao Céu que lhe desse a possibilidade de deixar entre os cristãos oprimidos a força da alegria.

O Canto da Prisioneira

Foi quando, aproximando-se de uma jovem encarcerada, de rosto descarnado e macilento, lhe disse ao ouvido:

— “Canta, minha filha! Tenhamos bom ânimo!… Convertamos as nossas dores da Terra em alegrias para o Céu!”

A triste prisioneira nunca saberia compreender o porquê da emotividade que lhe fez vibrar subitamente o coração. De olhos extáticos, contemplando o firmamento luminoso através das grades poderosas, ignorando a razão de sua alegria, cantou um hino de profundo e enternecido amor a Jesus, em que traduzia a sua gratidão pelas dores que lhe eram enviadas, transformando todas as suas amarguras em consoladoras rimas de júbilo e esperança.

Daí a instantes, seu canto melodioso era acompanhado pelas centenas de vozes dos que choravam no cárcere, aguardando o glorioso testemunho.

A Herança de Maria

Logo, a caravana majestosa conduziu ao Reino do Mestre a bendita entre as mulheres e, desde esse dia, nos tormentos mais duros, os discípulos de Jesus têm cantado na Terra, exprimindo o seu bom ânimo e a sua alegria, guardando a suave herança de nossa Mãe Santíssima.

Epílogo: Um Convite ao Silêncio Interior

Por essa razão, irmãos meus, quando ouvirdes o cântico nos templos das diversas famílias religiosas do Cristianismo, não vos esqueçais de fazer no coração um brando silêncio, para que a Rosa Mística de Nazaré espalhe aí o seu perfume!

Fonte: Livro Boa Nova, psicografado por Chico Xavier, ditado pelo espírito Humberto de Campos.

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