Crônica da Saudade

Artigo publicado originalmente em 2014, no jornal Guará Hoje

Por Gil DePaula

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Em um dia qualquer de 1973, soubemos que nossa família se mudaria de Taguatinga para o Guará 2. O fato, decidido por nossos pais, em alguns dias se tornaria realidade, representando para eles um significativo progresso de vida, pois abandonaríamos o barraco de madeira e, finalmente, depois de 14 anos morando no Distrito Federal, teríamos nossa casa de alvenaria.

Confesso que foi com tristeza que vi o caminhão de mudança parar à nossa porta. Naquele momento tive a consciência de que minha vida se transformaria, só não podia mensurar o alcance dessas transformações.

À noite, já cansado, depois que grande parte dos móveis já estava em seu lugar, deitei-me, entretanto, não consegui adormecer. A saudade do meu antigo canto calou fundo no meu coração, e a tristeza me tomou conta. Por incrível que possa parecer e até mesmo utópico, naquele momento, com 15 anos, deixei para trás o menino e o adolescente rapaz se formou.

E… Como era engraçada aquela Cidade-satélite, com suas casas e ruas iguais, sem iluminação nas ruas, e uma terra vermelha que sujava, inclementemente, as roupas e a pele. O vento levava a poeira para todos os cantos, e no período chuvoso a lama se tornava abundante.

Logo, nasceram novas amizades que tornaram aqueles anos especiais. Amizades regadas ao sabor das brincadeiras de queimada, futebol, salada mista, etc., e principalmente aos sons – sem disque jóqueis – dos sábados e domingos, na casa desses ou daqueles, onde, invariavelmente, aconteciam as primeiras paqueras.

Foi um período em que se confiava nas pessoas, ou me digam se não é confiar quando a porta da sua casa, que não possuía muros, estava sempre aberta, e não era raro um vizinho adentrá-la sem pedir permissão, só soltando um: “cheguei”. Se não é confiar quando você recebe em seu lar um bando de jovens que se movimentam por todos os compartimentos sem nada tocar, apenas pelo prazer de dançar ao som de Elton John e das músicas românticas das novelas das oito.

As novas gerações jamais poderão mensurar o que perderam, pois perderam a época da inocência. Nós também perdemos. Perdemos grandes amigos. Alguns pela morte, outros pelos comprometimentos da vida, que os afastaram. Porém, nada pode impedir a saudade que restou.

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